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A intersetorialidade ou a lógica do dividir para cuidar: desafios do percurso

Acadêmico: Lorena Maria da Silva

Orientadora: Maria Lucia Boarini

Ano: 2019

 

Resumo: Fortalecidas especialmente após a Constituição de 1988, as políticas sociais expressam o resultado das reivindicações de trabalhadores que, diante de condições precárias de trabalho, tiveram direitos sociais concedidos pelo Estado brasileiro. A fim de fazer frente aos problemas sociais que se acentuaram com a emergência do regime de trabalho livre, as legislações que sustentam tais políticas sociais se desenvolveram pautadas em estratégias que pudessem atender, de modo abrangente, as demandas surgidas no cotidiano da população. Podemos elencar a intersetorialidade como a principal estratégia assumida para a realização de um trabalho ampliado. Sendo um conceito polissêmico, a intersetorialidade é compreendida ora como uma estratégia de gestão, ora como uma lógica a ser seguida pelos setores públicos no intuito de otimizar os saberes em prol de um objetivo em comum. Quando nos referimos a crianças e adolescentes, o objetivo a ser cumprido com máxima prioridade é a proteção dos direitos dessa população por meio da articulação entre os setores públicos e privados. Essa prerrogativa nos direitos é conhecida como Doutrina da Proteção Integral e é apresentada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) indicando todas como dignas de cuidado. O ECA, reforçando o previsto pelas diretrizes, princípios e objetivos apregoados pelas políticas sociais, aponta a intersetorialidade como um importante plano de trabalho para auxiliar crianças, adolescentes e suas famílias a superarem situações de violações de direitos, especialmente quando estas ocorrem no ambiente intrafamiliar. Apesar de reconhecer a importância da intersetorialidade enquanto um recurso que pode levar as políticas sociais avante, questionamos o modo como ela tem sido efetivada, visto que, a despeito das distintas tentativas de articulação entre os setores da rede para a realização de um trabalho que se propõe integral e que não permita brechas no atendimento às crianças e aos adolescentes, o número crescente de denúncias no Brasil faz-nos interrogar sobre o modo como ela tem sido compreendida e aplicada. Diante do exposto, temos como objetivo investigar como tem se efetivado a intersetorialidade na rede de serviços públicos que visam a atenção e o cuidado a crianças e adolescentes em situação de violência intrafamiliar, tendo como recorte um município de pequeno porte II da região noroeste do Paraná. A fim de alcançar tal objetivo, realizamos uma pesquisa de caráter documental, fazendo uso das atas das reuniões da rede de serviços públicos, ocorridas no Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS) de tal município, entre os anos de 2013 a 2017. Para a análise dos dados coletados, tivemos como referência os preceitos do ECA e das demais legislações vigentes que versam sobre o cuidado à criança e ao adolescente. Os resultados indicam uma intersetorialidade que se efetiva de modo ainda frágil, apesar das tentativas dos profissionais em desenvolver práticas intersetoriais no município por meio das reuniões da rede de serviços públicos. A troca de tarefas entre os setores mediante os encaminhamentos foi o principal recurso utilizado para amenizar as consequências derivadas das situações de violações de direitos, além da responsabilização, pelos profissionais, de alguns setores públicos pelo êxito ou não das ações junto às famílias. Ademais, apesar de compreender que estratégias como a intersetorialidade não são capazes de resolver a estrutura fundante dos problemas sociais que incidem sobre o cotidiano dessa população e que tantas vezes decorrem ou são decorrentes das situações de violações de direitos, elas ainda são importantes diante da conjuntura socioeconômica atual. A defesa de uma política social de qualidade independe do reconhecimento das limitações desta. Portanto, apesar das insuficiências históricas apresentadas por elas, acreditamos que o trabalho corresponsável e comprometido, por meio da intersetorialidade, deve ser o norte das políticas sociais, quer seja para crianças, adolescentes ou adultos, para que os direitos concedidos pelo Estado se consolidem.
 
 
Palavras-chave: Intersetorialidade. Violência contra crianças e adolescentes. Estatuto da Criança e do Adolescente. Rede de Serviços Públicos. Proteção Integral.